quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Nancy, o feijão, e a má compreensão do amor

Se não existisse o amor, homens e mulheres só se uniriam para eventualmente reproduzir e bem provavelmente não existiria um pai presente na vida de uma família, pois este não veria sentido em cuidar das criaturas concebidas pela mulher. Portanto, até certa idade, as mães cuidariam dos filhos e os abandonariam quando já estivessem aptos a se alimentarem sozinhos e enfrentarem o mundo. Podemos supor que se não existisse o amor ninguém jamais questionaria a sua não-existência e acabaríamos por ser mais sentimentalmente resistentes ao nos depararmos com a morte, tão natural na existência da vida. Ou seja, o amor explica o porquê da busca incessante à bem-aventurança, ao passo que é mal compreendido e ninguém nota que o sentido para tudo nesta vida está exatamente empregado nele.
Partindo da má compreensão do amor, assim como milhares de outros céticos, Edgard desligou o monitor do computador, chamou Nancy ao quarto e entregou-lhe o seu sorriso acolhedor de praxe.
- Diga... – Nancy o abraçou por trás da cadeira e o beijou no rosto.
Estavam a três meses morando juntos.
- O que te faz acreditar que me ama, Nancy? 
Ela lhe ofereceu meio sorriso.
- Quem disse que o amo, Edgard?
Ele levantou e segurou duas mãos molhadas de espuma. 
- Não me ama?
- Claro que o amo Edgato, meu questionador despropositado! Qual é o problema?
O problema estava dentro de uma vesícula frágil e intocável.
Edgard a deitou na cama lentamente acariciando seus seios eriçados.
Nancy adorava quando eles transavam antes do almoço, parecia mais disposta a enfrentar o resto da tarde.
Ele a despiu e buscou em suas vísceras a fisionomia mais seria que estava disponível:
- Eu não a amo, Nancy. Eu gosto de você, mas até então, não consegui te amar. Eu ainda não sei o que é o amor, na verdade.
Nancy enrubesceu e procurou as palavras nas ondas da testa dele. Não encontrou nenhuma e lhe concedeu a deixa.
Ele foi lacônico:
- Escuta Nancy, já que tem amor por mim, defina-o.
Ela foi compreensiva e gracejou:
- O tutorial pode esperar depois que você me foder e eu desligar o feijão, amore?
- Eu não estou brincando minha felina, mas não falo tão sério também. Só diga que sentimento é este, quem sabe eu a ame e só precise desvanecer-me de uma neblina insidiosa que me cega?
Nancy fechou os olhos por um instante. Edgard a dominou apoiado com os cotovelos sobre a cama, enquanto que ela permanecia no meio dele com suas pernas abertas.
Dava para ouvir sua respiração seguida de um sussurro quase ininteligível:
- Você quer saber o que é o amor e se eu o tenho por você? Pois bem!
Encolheu os lábios, pensou no feijão queimando e enfim disse:
- Sabe quando acordamos abraçados de manhã, com aquele hálito funesto, e você se levanta para fazer o café e o leva para mim com um sorriso cretino de quem quer fazer sexo como um colegial virgem? Só responda sei, certo?
Ele riu.
- Certo! Continue.
- Sabe? 
- Desculpe, sei! 
- Pois então, o fato de você fazer isto remete um sentimento que por si só, pode não ser amor, no entanto, só de pensar em mim ao fazer o café, significa alguma coisa.
Edgard aquiesceu com a cabeça. Nancy continuou:
– Sabe quando você acha que eu estou dormindo e afaga meus cabelos, meu rosto, meu corpo e beija meu rosto? 
- É... Sei! E posso explicar o negócio do...
Dois olhos grandes de mel calaram-no.
- Pois bem! Isto já indica um sentimento. Que por si só, Edgato, me faz acreditar no amor.  
Ela entrelaçou as mãos nas costas dele e apertou-o com força.
- Sabe quando você ouve meus comentários com atenção e então conversamos por horas a fio coisas despretensiosas e você sorri o seu mais verdadeiro sorriso e me abraça sem que eu espere e depois nós saímos e nos embriagamos sozinhos e voltamos gritando da rua, felizes e pouco se fodendo para com os outros?
- Sei perfeitamente!
- Pois isto é o amor, Edgard. Você acha que eles entregam este sentimento numa caixa, pelos correios? Você acha que moramos juntos só para transarmos e assistirmos TV, em companhia um do outro, para não morrermos de tédio sozinhos? Você acha que uma pessoa sorri e beija ardentemente uma outra pessoa com a qual nada sente, depois de um dia exaustivo de trabalho? Acha que liga no meio da tarde só para dizer um oi sem relevância?
Edgard arqueia as sobrancelhas e não responde. Suas teorias vão além de um sentimento de amor latente. Ele acredita que tudo isto não passa de uma necessidade quimérica, não necessariamente um sentimento intrínseco. Ora, nem os pais amam seus filhos direito ultimamente. Edgard precisava dela para satisfazer seus colhões, porra! Esse negócio de amor era balela. Nancy era ótima. As idéias dela compactuavam com as suas; tinha um corpo desejável e era extremamente agradável. Edgard ficava exultante ao seu lado, pois gostava de sua presença despreocupada e suas atitudes despojadas. No entanto, não sentia amor. Amor era uma perspectiva que transcendia os limites humanos e se fosse levado realmente a cabo pelos que dizem amar o outro, o mundo seria realmente maravilhoso. Porém, morreria ao lado dela, se fosse o caso.
A cabeça de Nancy era tão aberta quanto um buraco negro. E a dele também. Nada que diziam um ao outro prejudicava a relação, pois eles aplicavam doses de circunspeção na veia.
Edgard fora mais fugaz do que os três gatos que eles criavam.
- Bom, então acho que eu amo você, Nancy. Se amar é querer morrer ao lado de alguém que transa diariamente, então eu a amo.
Ela apertou suas nádegas.
- Escuta amore, foda-se esta merda de sentimento. Eu poderia ter explicado de outra maneira o seu amor por mim. Eu poderia ter feito uma alusão qualquer. Mas caralho, eu me derreto com aquele beijinho que você me dá enquanto eu supostamente durmo e, acabei te revelando...
Ele não conseguiu descolar da face o sorriso apaixonado. Era mesmo um tolo. Ela continuou sua explanação:
- Eu posso te explicar de uma maneira mais simples. Veja: O amor é a grama que a vaca come, despreocupada, sem se importar com o excremento que posteriormente sujará o chão e sua bunda. O amor é capaz de fazer qualquer um renunciar a tudo e correr riscos, sem se importar com o que possa acontecer.
Ele riu alto e estremeceu. Sua flor desabrochou e ele teve uma ejaculação nas mãos da vaca que acariciava sua grama vermelha, ereta e inchada. 
Nancy estremeceu. Sorriu. E por fim praguejou com os dedos colados:


- Filho de uma puta! Vá desligar o feijão. 

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